Pesquisar aqui

terça-feira, 22 de março de 2011

REFLEXÕES SOBRE A ARTE NA IDADE MÉDIA E NO RENASCIMENTO



Fonte: GOMBRICH, 2000.

1) IDADE MÉDIA

"Até o fim do século XVI, a semelhança desempenhou um papel construtor no saber da cultura ocidental. Foi ela que, em grande parte, conduziu a exegese e a interpretação dos textos: foi ela que organizou o jogo dos símbolos, permitiu o conhecimento das coisas visíveis e invisíveis, guiou a arte de representá-las. O mundo enrolava-se sobre si mesmo: a terra repetindo o céu, os rostos mirando-se nas estrelas e a erva envolvendo nas suas hastes os segredos que serviam ao homem. A pintura imitava o espaço. E a representação — fosse ela festa ou saber — se dava como repetição: teatro da vida ou espelho do mundo, tal era o título de toda linguagem, sua maneira de anunciar-se e de formular seu direito de falar". (FOUCAULT, 2000)

Dentro da divisão esquematizada pelos historiadores (para a história do Ocidente, particularmente da Europa), a Idade Média corresponde ao período entre o séc. V e segunda metade do séc. XV.

Essa divisão está calcada em eventos políticos que provocaram alterações significativas na história do Ocidente. Assim, a delimitação de tempo denominada como Era Medieval corresponde ao período que vai da queda do Império Romano (ou do último imperador romano, Rômulo Augusto), em 476 d.C. (séc. V) até a descoberta da América, em 1492 (segunda metade do séc. XV).

Durante esse período, a produção artística (assim como boa parte da vida política e social) esteve profundamente ligada ao projeto de disseminação do Cristianismo europeu. Como o analfabetismo era a realidade da maioria dos camponeses, as artes visuais constituíam, ao lado dos sermões, meios ideais para propagar os fundamentos religiosos.

A Igreja Católica já era, àquela altura, uma instituição muito rica, tendo condições, portanto, de remunerar o trabalho dos artistas. A profusão de obras com temática religiosa (cristã) datadas desse período está relacionada a esse fato.

ASPECTOS DA PRODUÇÃO ARTÍSTICA


  • Uma das características da pintura medieval é a bidimensionalidade, em razão da ausência da noção de perspectiva (os historiadores da arte afirmam que, com a queda do Império Romano, muitas técnicas artísticas desenvolvidas pelos gregos, por exemplo, se perderam).
  • Em função disso, o tamanho das personagens, nas artes visuais, estava associado ao seu status simbólico, não tendo qualquer relação com a posição do observador ou dos elementos da tela.
  • Frequentemente, o trabalho artístico se produzia de modo coletivo ou anônimo. Por essa razão, há dificuldade em identificar artistas individuais do período medieval (*).
A imagem abaixo, que representa duas produções sobre o mesmo tema, uma renascentista e outra medieval, ilustra tanto o aspecto da bidimensionalidade quanto o aspecto relativo à "autoria anônima" da obra.

Fonte: GOMBRICH, 2000.

2) RENASCIMENTO

O período conhecido, na história ocidental, como Renascimento está demarcado a partir das manifestações culturais do séc. XIV, na Itália, com posterior difusão no resto da Europa no decorrer dos séculos XV e XVI.

O conceito vem da palavra italiana renascitá - acreditava-se que o período anterior havia sido um longa noite gótica, um período de trevas.

Mas Gombrich esclarece melhor essa história:

"A palavra renascença significa nascer novamente ou ressurgir, e a idéia de tal renascimento ganhou terreno na Itália desde o tempo de Giotto. Quando as pessoas desse período queriam elogiar um poeta ou um artista, diziam que sua obra era tão boa quanto a dos antigos. Giotto fora exaltado assim como um mestre que tinha liderado um verdadeiro ressurgimento da arte: as pessoas queriam significar com isso que a arte de Giotto era tão boa quanto a daqueles famosos mestres cujas obras encontravam louvadas nos autores antigos da Grécia e de Roma. Não surpreende que essa idéia se tornasse popular na Itália. Os italianos estavam perfeitamente cônscios de que, num passado distante, a Itália, tendo Roma por capital, fora o centro do mundo civilizado, e que seu poder e glória se dissipara quando as tribos germânicas, godos e vândalos, invadiram o país e desmantelaram o Império Romano. A idéia de um renascimento associava-se na mente dos romanos à idéia de uma ressurreição da 'grandeza de Roma'. O período entre a idade clássica, para a qual voltavam os olhos com orgulho, e a nova era de renascença, que aguardavam com esperança, era meramente um melancólico interregno. 'O Período Intemédio'. Assim, a idéia de uma renascença foi responsável pela idéia de que o período interposto era uma Idade Média — e ainda usamos essa terminologia. Como os italianos culpavam os godos pela queda do Império Romano, começaram a se referir à arte desse período intermediário como arte gótica, com o que pretendiam significar bárbara — tal como hoje falamos do vandalismo quando nos referimos à destruição inútil de belas coisas".

O Renascimento se desenvolveu na Filosofia, nas Artes, nas Ciências e na Astronomia, a partir de transformações culturais, sociais, econômicas, políticas e religiosas decorrentes da transição do Feudalismo para o Capitalismo.

A Renascença, como também se costuma chamar a esse período, está profundamente ligada ao humanismo, a partir do interesse dos intelectuais europeus pelas referências clássicas greco-romanas, anteriores à expansão do Cristianismo.

Alguns dos valores e ideais difundidos pelo Renascimento:

Antropocentrismo: o homem deve estar no centro dos interesses da humanidade.
Hedonismo: o prazer imediato e individual é o bem supremo da vida humana.
Racionalismo: o raciocínio, como operação mental, discursiva e lógica, deve usar proposições para alcançar as conclusões verdadeiras, falsas ou prováveis.
Otimismo: forma de pensamento contrária ao pessimismo que o Renascimento credita à Idade Média.
Individualismo: exprime a afirmação e liberdade do indivíduo frente à sociedade ou ao Estado.

ASPECTOS DA PRODUÇÃO ARTÍSTICA
  • No campo das artes, se propôs, pela primeira vez, uma visão leiga das obras religiosas (estudo lógico e literário da Bíblia, por exemplo).
  • Houve uma valorização do abstrato, expresso principalmente pelo conhecimento matemático
  • Desenvolvem-se algumas inovações na produção artística, como o advento da pintura a óleo.
  • Desenvolvem-se ainda certos aspectos fundamentais para a produção das artes visuais, como as noções de proporção e de profundidade, assim como a representação do corpo humano a partir do estudo rigoroso da anatomia.
"Sabemos muito bem que, em arte, não podemos falar de progresso na acepção em que falamos do progresso do saber. Uma obra de arte gótica pode ser tão grande quanto uma obra da Renascença. Não obstante, talvez seja natural que para as pessoas desse tempo, que entraram em contato com as obras-primas do Sul, sua própria arte tenha parecido subitamente obsoleta e grosseira. Foram três as realizações tangíveis dos mestres italianos para as quais eles podiam apontar. Uma foi a descoberta da perspectiva científica, a segunda o conhecimento de anatomia – e, concomitantemente, a representação perfeita do belo corpo humano – e, em terceiro lugar, o conhecimento das formas clássicas de construção, as quais pareciam simbolizar, para as pessoas desse período, tudo o que era digno e belo". (GOMBRICH, 2000)


(*) Vale lembrar que a figura do autor - como instância produtora dos sentidos da obra - só vai se desenvolver depois, sobretudo com a consolidação da imprensa. Quem quiser entender melhor como se configura esse fenômeno, no campo das artes, pode acessar aqui o artigo de Daniela Beccaccia Versiani, intitulado "Considerações sobre a noção de autor", publicado na Revista Literatura em Debate, v.3, n.4, p. 1-20, 2009.

REFERÊNCIAS


FOUCAULT, Michel. A prosa do mundo. In: As palavras e as coisas. 8 ed., 2 tiragem. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

GOMBRICH, Ernest H. História da arte. 16 ed. Rio de Janeiro: LTC, 2000.

VERSIANI, Daniela Beccaccia. Considerações sobre a noção de autor. Revista Literatura em Debate, v.3, n.4, 2009, p.1-20.


Um comentário:

Elcio disse...

Parabens pelo trabalho. Era o que estava buscando para trabalhar uma aula sobre o Renascimento.

Valeu!